Fotógrafo em Destaque: Saulo Cruz

entrevista Flickr

Fale um pouco sobre você.

Tenho 32 anos, sou peixes com ascendente em aquário, ou seja, estou sempre viajando no espaço-tempo-gravidade. Morei no Rio de Janeiro. As pessoas acham que sou carioca mas nasci em Brasília e depois voltei a capital. Ninguém lá em casa é de jornalismo ou de fotografia. Uma irmã é professora de artes, a outra é nutricionista, meu irmão é fã de Ratos de Porão, meu papai toca violão e minha mamãe adora contar causos. Cresci vendo Sessão da Tarde, Corujão e lendo todas as histórias em quadrinhos que chegavam em minhas mãos. Frequentava todas as bibliotecas da cidade, adorava ler romances adultos de espionagem na Segunda Guerra Mundial. Numa das casas em que moramos no Rio descobri um tesouro abandonado pelo inquilino anterior: escondido dentro do sofá haviam centenas de livros pockets da série cult Perry Rhodan, de ficcão científica. Acho que tinha 9 anos. E assimilei toda aquela trama maluca permeada de castores telepatas falantes, homens eternos e planetas robôs. Acho que foi aí que percebi que a imaginação, assim como a zueira, não tem limites.

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Sou fotógrafo desde 2002. Quer dizer, no início fui assistente. Tive sorte: cometi todos os erros que pude. Essa começo me deu uma boa estrutura. Antes disso tive uma breve experiência com fotografia no Exército Brasileiro, quando servi como soldado. Depois arranjei um emprego no estúdio do Jorge Campos, um mestre já falecido, infelizmente. Mais pra frente fui trabalhar com outro guru da fotografia, que era o Luiz Carlos B. Xavier – também lamentavelmente já falecido – que completou minha formação de fotografia. O Jorge fazia arte e o Luiz Carlos fazia contabilidade. Somando essas duas visões tive um panorama completo da profissão: fazer o melhor e entregar coisas lindas. Mas que não sejam de graça porque vivemos de luz, porém pagamos o aluguel com dinheiro.

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O que te fez começar a tirar fotos, e há quanto tempo você fotografa?

O principal fator que me levou a aprender a fotografia primeiro foi a subsistência. De família simples, precisava saber fazer alguma coisa para poder me arranjar na vida. Agarrei a oportunidade de fotografar porque queria comprar uma câmera profissional poderosa (a primeira foi a F3 da Nikon). Me apaixonei pela linguagem infinita e o meio fantástico que é a fotografia. Conheci pessoas incríveis.

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O que mais te fascina em fotografia? Como você descreveria seu estilo?

É meio pedante e talvez seja a primeira vez que admito isso em público: o fotógrafo é eterno através de tudo o que viu. A não ser que aconteça uma guerra atômica ou a energia dos arquivos na nuvem (como o Flickr!) se esgote, deixarei meu testemunho de todos os lugares que fui e as pessoas que conheci. Isso me encanta.
Estilo. Essa é uma boa pergunta. Assim como a gente muda de opinião, o nosso estilo também muda, né? No começo tinha a fotografia muito iluminada. Muito flash direto ou rebatido. Aproveitava a luz difusa de um dia nublado. Hoje aceito a sombra. Aceito o escuro. Acho que luz e sombras estão numa constante dança onde em cada momento um conduz o outro.

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Qual é o seu equipamento? E você usa algum equipamento especial ou usa técnicas especiais?

Em pautas que não sei bem o que vai acontecer, como uma cobertura jornalística ou um casamento, costumo carregar duas câmeras. Uma com sensor DX, uma lente zoom longa, tipo 28-200mm. Gosto de olho de peixe, tenho uma 10-17mm. E + o flash. Na outra câmera, de sensor FX, uso três lentes fixas: uma 24, uma 85 e a minha favorita, a cinquentinha.

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Equipamento especial? Ainda não tenho um drone, hehehe. Técnicas especiais: curto muito panning e a “zoomada” com a câmera DX. Me apetece disparar muitas vezes com flash a pino a la paparazzi. Na câmera de sensor maior, a FX, adoro usar as aberturas máximas das lentes fixas, prezo a tridimensionalidade gerada pela pequena profundidade de campo. Raciocinio oposto à câmera anterior: “roubo” momentos, fico escondido esperando o sorriso, o abraço, o instante decisivo (salve Bresson!). E, ainda com a FX, em pouca luz subo bastante o ISO, sem redução do ruído. Considero agradável, até certo ponto, o grão “estourado” em preto e branco.

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Como é seu processo de postagem?

Trabalho no Lightroom, é um programa excelente (eles não estão me pagando um centavo pra fazer propaganda aqui).
Talvez pela minha escola inicial de fotografia jornalística/institucional prefiro manter alguma referência “real” com as cores. O máximo que me permito é alguma saturação superior, sem chegar a um Marcos López. E adiciono alguma vinheta. Gosto desse efeito. No futuro pretendo anarquizar mais na edição!

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Qual é a sua inspiração para as FotoTiras? Fale um pouco mais sobre elas.

As ideias pras FotoTiras vem do dia a dia. Quanto mais trabalho, mais situações acontecem, mais quadrinhos me vem na cabeça.
Sempre gostei de desenhar. E, vivendo de fotografia, na rotina hardcore da escassez do tempo, me sentia meio triste de deixar de produzir alguma coisa divertida. Segui o exemplo dos quadrinhos autorais do Crumb, do Allan Sieber, do Angeli, do Larte (e segue uma lista enorme!). Fui contar como é a vida de um fotógrafo, quais as angústias (digital X analógico), triunfos (a captura da foto perfeita) e medos (como comprar a próxima câmera?). E muitos outros assuntos do metier!

FOTOTIRAS - SORRIA

Acho que quadrinhos e fotografia tem tudo a ver. Porque no final estamos trabalhando com narrativas visuais. Sejam compostas diretamente da cabeça de um autor, o desenhista, ou sendo o resultado da interação com a realidade, o fotojornalista.
Tem tanta gente legal que acompanha a página no Facebook. O retorno é imediato! Algumas tiras viram memes e me dá orgulho dos meus “filhos” estarem correndo o mundo. E outros nem tanto, ficam lá, pegando teia de aranha. Mas amo tudo que publico das FotoTiras porque são produtos de alguma situação que me fez refletir sobre a profissão.

A cabeça do Fotógrafo.

O que você mais gosta no Flickr? Quando você conheceu o site e porque ele abriga seu trabalho?

Acompanhei com ansiedade os próximos lançamentos de redes sociais. Tinha o Fotolog mas achava limitado de tudo. Achava o visual muito brega – desculpa, Fotolog.
Muito recentemente instalei o Flickr no meu smartphone (e também muito recentemente COMPREI um smartphone) e escrevi a seguinte resenha:

“Uma Rede Social Vintage. Ou Para Fotógrafos
Gosto do Flickr porque foi a primeira rede social que usei de forma séria: sou fotógrafo e organizei meu acervo/portfolio lá, através de tags & álbuns. É ótima pra conhecer gente através dos grupos temáticos e o que mais me encanta é poder ler os dados EXIF das câmeras. Dá veracidade ao autor da imagem. Anh e também as licenças de uso são legais porque você pode colocar coisas que as pessoas podem baixar e usar para divulgar seu trabalho”

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Se preciso mostrar a um cliente uma fotografia ou desenho referência para um trabalho está tudo a mão. E adorei o redesenho dos thumbnails das fotos pra visualizar. Parece um caleidoscópio das suas postagens. Realmente acho muito bacana o Flickr, uma boa solução de armazenamento e compartilhamento de imagens. E a última grande novidade: liberam 1 TERA pra você. Eu, que sempre subi a maioria das fotos com 800px no lado maior, preenchi ridículos 1% do espaço. Agora, com conexões mais rápidas, acredito que esse número suba. :-)

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Que outro membro do Flickr e/ou grupo te influencia?

Muita gente dentro do Flickr me influencia. Tenho grande respeito pelo Flickr da Casa Branca com suas imagens referência para meu trabalho, adoro a trajetória do Pete Souza. E, claro, nosso correspondente brasileiro que é o Blog do Planalto com o trabalho dos Stuckerts. Adoro as cores que o Tommy Ga-Ken Wan tira da D700 da Nikon e seus textos muito sensíveis sobre a condição humana. Acho esse cara muito divertido, o Kris Krug, adoro os retratos que ele faz e também seus selfies de pescaria. Um dos muitos exemplos de bibliotecas vintage, janelas pro passado, excelente compilação do James Vaughan . De desenho, gosto dos traços contemporâneo e paradoxais do Tom Gauld, e esse brasileiro ilustrador free lancer, profundamente autoral, o Tiago Lacerda. As astronautas e mulheres fortes de Philip Bond. As cores e traços gentis em narrativas certeiras de Samanta Flôor. Enfim, dá pra falar disso a noite toda!

Qual é a sua foto favorita na sua conta e por quê?

Muito difícil essa pergunta. Cada fase da vida temos uma coleção de valores que refletem nas imagens que fazemos. Mas, se for pra resumir na transformação que uma fotografia fez em minha vida, foi essa aqui:

O Suor de Lucas Prado

Porque foi meu primeiro prêmio de fotografia. Percebi que a profissão abriu portas que antes julgava fechadas. Tive oportunidade de reconhecer o poder do autor da imagem a partir daqui.

E quais são suas 3 fotos favoritas de outros usuários e por quê?

Hoje tenho 7.263 fotos favoritadas. Difícil reduzir a três. Entretanto, a cada momento da nossa vida queremos ver determinadas cores, nos identificar com determinadas cenas que exprimem o que sentimos.
Pensando nisso agora, escolhi:

Esses jovens iluminados nesse ambiente cosmopolita, de Berta Pfirsich
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A garota de outono e seu bokeh belíssimo de 50mm

Autumnal girl

E os dois amigos hippies de Tom Balley
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O que mais você curte além de fotografia?

Gosto de procurar novas músicas de ritmos que jamais ouvi. Curto groove jazz e música latina de Puerto Rico. Ler sempre é uma paixão e atualmente estou lendo muitas coisas místicas e mágicas.

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Se tem um segredo que você gostaria de compartilhar com o Flickrverse, qual seria?

Segredo? Pensei logo no pior, nas fotos que ninguém pode ver, em visualização bloqueada. Que, de minha parte, não existem. Se não é pra ninguém ver toda distância da web é pouca.

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Complete: Em 5 anos, eu…

Quero estar com algum livro publicado. De fotografia ou de desenhos. Ou de FotoTiras!

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Obrigado por contar sua história, Saulo! E pelo FotoTiras exclusivo pro Flickr que abre a entrevista!

Para ver mais do trabalho do Saulo, você pode visitar as contas dele no Instagram e Twitter, o Tumblr e o Facebook do FotoTiras e, é claro, a conta do Flickr dele e siga-o se quer ficar de olho nas novas fotos.

A abundância é uma falsa ilusão de infinito.